sábado, 27 de fevereiro de 2010

Vale a pena ler...

Um dia, quando eu era caloiro na escola, vi um miúdo da minha turma a caminhar para casa depois da aula.

O nome dele era José.

Parecia que estava a carregar os seus livros todos.

Eu pensei:

- Porque é que leva para casa todos os livros numa sexta-feira?

Ele deve ser mesmo um marrão.

Como já tinha o meu fim-de-semana planeado (festas e um jogo de futebol com meus amigos no sábado a tarde) encolhi os ombros e segui o meu caminho.

Conforme ia caminhando, vi um grupo de miúdos a correr na direcção dele.

Eles atropelaram-no, arrancando-lhe todos os livros dos braços e empurraram-no, de tal forma que ele caiu.

Os seus óculos voaram, e eu vi-os aterrarem na relva a alguns metros de onde ele estava. Ele ergueu o rosto e eu vi uma terrível tristeza nos seus olhos.

O meu coração penalizou-se por ele. Então, corri até ele, enquanto ele gatinhava à procura dos óculos, e pude ver lágrimas nos seus olhos.

Enquanto lhe entregava os óculos, eu disse:

- Aqueles tipos são uns parvos. Eles deviam era arranjar uma vida própria.

Ele olhou para mim e disse:

- Obrigado!

Havia um grande sorriso na sua face. Era um daqueles sorrisos que realmente mostram gratidão. Eu ajudei-o a apanhar os livros, e perguntei-lhe onde morava.

Por coincidência, ele morava perto da minha casa. Então eu perguntei como é que nunca o tinha visto antes.

Ele respondeu que antes frequentava uma escola particular.

Conversámos todo o caminho de volta para casa, e carreguei-lhe os livros.

Ele revelou-se um miúdo muito porreiro.

Perguntei-lhe se queria jogar futebol no Sábado comigo e com os meus amigos. Ele disse que sim.

Ficamos juntos todo o fim-de-semana, e quanto mais eu conhecia José, mais gostava dele. E os meus amigos pensavam da mesma forma.

Chegou a Segunda-Feira, e lá estava o José com aquela quantidade imensa de livros outra vez. Parei-o e disse:

- Diabos, pá! Vais fazer o quê com os livros de novo?

Ele simplesmente riu e entregou-me metade dos livros.

Nos quatro anos seguintes José e eu tornámo-nos melhores amigos.

Quando nos estávamos a terminar o 12º ano, começámos a pensar na faculdade. José decidiu ir para Coimbra, e eu ia para a o Lisboa.

Eu sabia que seríamos sempre amigos e que a distância nunca seria um problema. Ele seria médico e eu ia tentar entrar em educação física para seguir uma carreira no futebol.

José era o orador oficial da nossa turma. Ele teve que preparar um discurso de formatura. Eu estava super contente por não ser eu a subir ao palanque e discursar.

No dia da festa de finalistas eu vi José. Ele estava óptimo. Estava mais encorpado e realmente tinha uma boa aparência, mesmo usando óculos. Ele saía com mais miúdas do que eu, e todas as raparigas o adoravam!

Às vezes eu até ficava com inveja. Hoje era um desses dias. Eu podia ver o quanto ele estava nervoso por causa do discurso. Então dei-lhe uma palmadinha nas costas e disse:

- Ei, rapaz, vais-te sair bem!

Ele olhou para mim com aquele olhar (aquele olhar de gratidão) e sorriu.

- Obrigado. - disse ele.

Quando ele subiu ao oratório, limpou a garganta e começou o discurso:

- Este momento é para agradecermos aqueles que nos ajudaram durante estes anos duros. Aos pais, aos professores, aos irmãos, talvez até a um treinador, mas principalmente aos amigos. Eu estou aqui para lhes dizer que ser um amigo para alguém é o melhor que se pode dar. Eu vou-lhes contar uma história...

Eu olhei para o meu amigo sem conseguir acreditar enquanto ele contava a história sobre o primeiro dia em que nos conhecemos.

Ele tinha planeado suicidar-se naquele fim-de-semana. Contou a todos como tinha esvaziado o seu armário na escola, para que a mãe não tivesse que fazer isso depois dele morrer, e estava a levar as suas coisas todas para casa. Ele olhou directamente no meus olhos e deu-me um pequeno sorriso.

- Felizmente eu fui salvo. O meu amigo salvou-me de fazer algo inominável.

Eu observava, com um nó na garganta. Todos na plateia ouviam, enquanto aquele rapaz popular e bonito contava a todos sobre aquele seu momento de fraqueza. E vi a mãe e o pai dele a olharem para mim e a sorrir com aquela mesma gratidão.

Até aquele momento eu nunca me tinha apercebido da profundidade do sorriso que ele dirigiu naquele dia.

Por isso, nunca subestimes o poder das tuas acções. Com um pequeno gesto podes mudar a vida de uma pessoa. Para melhor ou para pior. Deus coloca-nos a todos nas vidas uns dos outros para que tenhamos um impacto um sobre o outro de alguma forma.

Procura o bem nos outros

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